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A Imunidade Parlamentar

A Roma antiga é uma das civilizações cujo legado mais contribuiu para a história da humanidade, uma de suas principais contribuições foi seu sistema jurídico, avançado para a época e que influenciaria todos os sistemas jurídicos da Europa continental. Deste período data a origem da palavra imunidade, no latin immunitate, que significa a condição de não ser sujeito a algum ônus ou encargo, isenção; seu sentido jurídico refere-se a direitos, privilégios ou vantagens pessoais de que alguém desfruta por ocasião do cargo ou função que exerce. Porém é sua conotação política que será abordada aqui, ou seja, a imunidade Parlamentar. Ela é um dispositivo constante na maior parte das democracias do mundo e sua origem remonta ao século XVII, na Inglaterra. Com a Revolução Inglesa ou Gloriosa de 1688, a burguesia toma o poder da nobreza e o poder passa a ser dividido entre executivo, legislativo e judiciário. Antes, os reis eram absolutos, autoritários e concentravam em suas mãos todo o poder político: elaboravam leis, aplicavam e julgavam a si mesmo em relação ao cumprimento das mesmas. Com o surgimento do parlamento (legislativo) encarregado de fazer as leis, que deveriam ser aplicadas pelo rei (executivo) e fiscalizada pelos juízes (Judiciário), os reis, tiveram seu poder diminuído e com dificuldades de assimilar essa prática política, tendiam a retaliações. Para evitar esse transtorno é criado o instituto da Imunidade Parlamentar, conquista que se afirmou como uma prerrogativa dos representantes do povo no exercício livre do mandato ante as pressões dos setores inconformados do Executivo ou de particulares. Tem a imunidade, a função de garantir a inviolabilidade do mandato. No caso, o parlamentar pode emitir opiniões, fazer críticas, formular denúncias, fiscalizar, propor e votar.
Posteriormente, esse dispositivo, foi incluído em outras constituições, principalmente na dos EUA de 1787 e Francesa de 1791. De acordo com as particularidades de cada país, ela pode apresentar algumas variações e ser tratada de forma não muito diferente da original. Nas constituições, podemos perceber dois tipos de imunidades parlamentares: A imunidade material (freedom of speech) assegura ao parlamentar inviolabilidade por suas opiniões, palavras e votos, no recinto da respectiva câmara, e garantindo ampla liberdade no exercício do seu mandato, não só frente ao governo, como aos partidos e ao corpo eleitoral. A Imunidade Formal (freedom from arrest) protege o congressista contra prisões arbitrárias e processos tendenciosos. As imunidades acima, como já foi dito, têm variações e limites de acordo com o entendimento técnico, ideológico, pedagógico, processual, conjuntural, etc., portanto, notamos algumas diferenças de país para país. Podemos citar alguns exemplos e fazer algumas observações: Na Inglaterra, a imunidade material não enfrenta limitações, sendo aplicada integralmente de acordo com sua concepção original. Já a imunidade formal não tem a mesma tolerância. Os ingleses consideram que o fato de ser parlamentar, não é obstáculo ao exercício da justiça penal. Se um membro do Parlamento é preso sob acusação de praticar um crime tipificado na lei penal, o juiz deve simplesmente avisar a Câmara, que não teria poder de impedir a ação. Tampouco, podem influir contra as prisões preventivas ou decretadas por desobediência aos tribunais. Nos EUA, parlamentares não podem ser presos, durante as sessões da câmara, nem no trajeto de ida ou regresso das mesmas. Mas, este dispositivo tem limites se o parlamentar tiver cometido crime de traição, conspirado contra a paz ou participado de um crime de alta relevância. Estas são determinações constantes em artigos da constituição americana desde 1787. Portanto, podemos perceber que no direito legislativo americano, a imunidade parlamentar tem algumas limitações, mas não há necessidade de prévia autorização da câmara para um processo penal.
A França exclui a necessidade de prévia licença para o processo e admite, inclusive, a prisão em decorrência de condenação criminal definitiva. O Art. 26 da Constituição Francesa estabelece: "Nenhum membro do Parlamento pode ser perseguido, procurado, preso ou julgado pelas opiniões ou votos emitidos no exercício de suas funções. Nenhum membro do Parlamento pode, durante as sessões, ser perseguido ou preso por motivos criminais ou correcionais, a não ser com a autorização da Assembléia da qual faz parte, exceto no caso de flagrante delito. Nenhum membro do Parlamento pode ser preso fora da sessão, a não ser com a autorização da mesa da Assembléia da qual faz parte, exceto em caso de flagrante delito, de buscas autorizadas ou de condenação definitiva. A detenção ou busca de um membro do Parlamento é suspensa se a Assembléia da qual faz parte assim o requerer", este artigo da constituição francesa assemelha-se ao Art. 53 de nossa constituição que trata, além de outras questões, da imunidade parlamentar. Na Alemanha, a Câmara exige uma prévia licença para instauração de um processo e tem ainda o poder de determinar a soltura do congressista. É permitida uma ampla liberdade no exercício de seu mandato. Mas essa liberdade tem limitação nos casos de flagrante delito ou ofensas caluniosas. A Itália possuía uma constituição semelhante à brasileira, no que diz respeito às imunidades. Após a deflagração da chamada "operação mãos limpas", houve uma alteração constitucional radical, fruto de uma forte pressão popular. No artigo atual, a imunidade formal continua ampla (opiniões, palavras, votos). Já na imunidade formal, suspendeu-se a necessidade de licença para o processo criminal, mas continua necessária a autorização do parlamento para a prisão do parlamentar.
No Brasil, imunidade e impunidade até pouco tempo atrás eram sinônimos. Deputados e senadores só podiam ser processados quando o congresso desse autorização e este dispositivo constitucional era usado para acobertar estelionato, sonegação de imposto, tentativa de assassinato, atitudes suspeitas, escusas e criminosas de alguns parlamentares, que se consideravam acima da lei. Em 20 de dezembro de 2001, deputados e senadores, aprovaram uma emenda à Constituição ( PEC 35/2201 ) e a imunidade foi restringida. A extinção desse privilégio desestimula a candidatura de pessoas em débito com a Justiça ao passo que, o Supremo Tribunal Federal não precisa mais solicitar ao Poder Legislativo a licença prévia para processar parlamentares. Após a aprovação desta emenda, deputados federais, senadores e deputados estaduais têm imunidade apenas para expressar suas opiniões e votar da maneira que bem entenderem. No mais, ficam sujeitos ao cumprimento da lei como os demais brasileiros. Podem ser processados, inclusive, por crimes cometidos antes do mandato parlamentar. Todavia existe uma restrição, para os parlamentares que estiverem exercendo o mandato, é necessária autorização. Isto tem a finalidade de evitar que um político acusado seja vítima de perseguição política. Neste caso, o partido, a Câmara ou o Senado podem pedir a suspensão do processo. Mas essa solicitação requer uma maioria simples das casas legislativas federais, ou seja, tem de receber o apoio de 257 deputados ou 41 senadores. A iniciativa de apresentação do pedido deverá ser feita pelo partido político do acusado e o pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo improrrogável de 45 dias após seu recebimento pela Mesa Diretora. O projeto aprovado deve ainda ser revisto para que seja incluso mais um dispositivo para aperfeiçoá-lo. Por esse dispositivo o parlamentar acusado, se tornará inelegível mesmo se renunciar ao mandato para fugir da cassação. Isto se os congressistas levarem o julgamento até o final e concluir que o acusado é culpado. Na forma como está, o parlamentar acusado, antes de ser expulso, renuncia ao mandato para poder se candidatar às próximas eleições.

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