Pesquise no Blog

Honra e Virtude nas Formas de Governo Segundo Montesquieu

Diferente de Aristóteles que dividia as formas de governo em Democracia, Aristocracia, e República, por se basear em quem exerce o poder, em quem governa; Montesquieu se preocupa com a forma com que o poder é exercido, como se governa. Orientado por este princípio, ele classifica os regimes políticos em governo republicano, monárquico e despótico. Nesta tipologia, elementos como a virtude e a honra não são uma necessidade a todas as formas de governo, e naquelas em que são levados em conta, podem adquirir conotações diferentes. A começar pelo tipo republicano de governo, que se divide em Democracia e Aristocracia, e onde a natureza do poder soberano é exercida por todo o povo ou por uma parcela dele. Os valores positivos acompanham esta divisão, sendo amplamente difundidos na Democracia, onde a virtude adquire papel central, e em menor escala na Aristocracia, na qual Montesquieu identifica uma utilização moderada da virtude por parte dos dirigentes do regime. Todavia, é preciso salientar que apesar do que se divulga e quer se fazer crer, os valores positivos nos dois regimes, não são praticados da forma como seria necessário para um eficiente andamento da sociedade, estando o equilíbrio do sistema ligado mais à prática legal do que à existência de princípios morais. O autor faz um paralelo entre a Aristocracia Republicana e a Monarquia, pois considera que o povo está em relação ao governo na primeira, da mesma forma que os súditos estão para o monarca na segunda, ou seja, em situação de submissão. O descontentamento da população por se encontrarem nesta condição, seria atenuado por condutas e práticas inspiradas nos princípios morais da virtude, da honra e do respeito, porém estas não são os princípios que regem a Monarquia, ela pode ser exercida com o mínimo de virtude possível e se pautaria principalmente pela honra. No governo monárquico, a exemplo do que ocorre nos seus correlatos republicanos, é mister a existência de um código de regras para organizar a relação entre governante e governados. Sendo que, estas normas se aplicariam de maneira indistinta entre a sociedade na Democracia, de modo parcial na Aristocracia e ainda mais limitada na Monarquia, tendo em vista a demasiada centralização de poder existente neste regime. Mesmo considerando que haja uma classe intermediária entre o soberano e o povo, como a nobreza e o clero, o poder na Monarquia ainda seria fortemente centrado na figura do príncipe. Este fator levou pensadores como Voltaire, a considerar a Monarquia semelhante ao Despotismo, a ponto de se confundirem. No Despotismo por sua vez, a virtude não seria necessária como o é na Democracia, e como a honra é necessária na Monarquia, estes elementos são substituídos nesta forma de governo pelo medo. O príncipe neste caso detém todo o poder do Estado, sendo de sua responsabilidade tudo o que se refere ao andamento da sociedade. Podendo ele delegar algumas funções a pessoas de sua confiança, mas estas sempre estarão sujeitas às imposições do soberano, que busca limitar a autonomia daqueles, de modo a preservar seu poder. O déspota então gozaria de plenos poderes para administrar seu governo da forma como lhe fosse conveniente, garantindo a obediência de sua vontade por parte de seus súditos mediante o permanente temor do uso da força.
MONTESQUIEU, Charles Louis de Secondat. Do Espírito das Leis. Coleção Os Pensadores, Abril Cultural, São Paulo, SP, 1979.

Burocracia e Burocratização

No princípio de sua formulação, pelo economista fisiocrático Vincent de Gournay em meados do século XVIII, o termo Burocracia, referia-se ao corpo estamental que circundava o soberano e que em grande medida era dependente deste. Tratava-se de funcionários e empregados que possuíam funções específicas dentro do regime monárquico. Desde então o termo foi revestido de um sentido fortemente pejorativo, pois procurava representar a morosidade do serviço público, seu excessivo formalismo traduzido particularmente pela abundância de leis, que em geral eram ineficazes e serviam somente para acentuar a lentidão de todo o sistema estatal, como também o privado, e o desperdício de dinheiro. As teses inspiradas no Marxismo também atribuíram um sentido negativo à Burocracia, que nesta acepção significava uma administração fortemente centralizada e cheia de ritualismos, organização esta que, mais recentemente na constatação de Robert Michels, acarretava uma oligarquização. Estes fatores aliados ao intenso espírito corporativo e à falta de iniciativa, contribuíram para que o sentido negativo do termo Burocracia se disseminasse no imaginário e na linguagem coloquial da população. Entretanto, no século XIX o termo passou indicar também, um sentido mais técnico e menos polêmico, designando a crescente especialização das funções administrativas, a ascensão na carreira baseada no mérito, ou seja, uma prática administrativa pautada pela eficiência. Para critério de análise do termo, Norberto Bobbio destaca a conceituação elaborada por Max Weber que se tipifica basicamente em dois domínios, o da legitimidade e do aparelho administrativo. Através destes domínios ele busca caracterizar a Burocracia de acordo com o tipo de poder exercido através do Estado, podendo ser: carismático, tradicional e legal, analisando ainda esta tipologia, sob o aspecto conceitual, organizacional e histórico. Como podemos perceber, a análise de Weber é bastante ampla e abrange praticamente todas as formas de estrutura social e modelos políticos. Todavia, a Burocracia não é inerente à sociedade e ao Estado, ela é fruto da divisão e hierarquização do trabalho, decorrente das transformações pelas quais a humanidade tem passado no decorrer dos séculos. E neste processo de organização do trabalho que surge a Burocracia, surge um termo derivado, a Burocratização, que semelhante a seu termo de origem, possui um sentido negativo, pois, segundo palavras do próprio Bobbio “indica uma degeneração da estrutura e das funções dos aparelhos burocráticos”. Sendo assim, Burocratização, seria o emprego de modelos e a utilização de práticas que não contribuiriam para a eficiência do sistema, como a fragmentação da autoridade; a proliferação de organismos, a falta de conexão entre estes; excesso de ritualismos, acarretando lentidão de suas atividades; entre outras. Esta degeneração foi considerada por alguns teóricos como B. Rizzi como uma tendência inevitável, tendo em vista que, analogamente à Burocracia, se verificava nas mais variadas formas de organização. Em particular, Bobbio discorre sobre os efeitos da Burocratização nos Estados coletivistas, dialogando com autores socialistas como Rosa Luxemburgo, que defendia a idéia de que o aparelho burocrático do movimento operário, especialmente os sindicatos e partidos proletários, contrariamente aos seus ideais socialistas, também tendiam a uma degeneração; esta se traduziria principalmente através de um processo de oligarquização. Isto é, os trabalhadores que se afastavam de suas funções operárias para assumirem funções burocráticas no aparelho dos sindicatos e partidos, possuíam uma tendência de conservarem-se nesta posição, sendo oportunistas e utilizando para isso, os próprios elementos da função, aliados a um forte corporativismo. Isto acarretaria em um centralismo monopolizante e uma acentuada divisão entre dirigentes e as massas, constituindo os primeiros uma classe social dominante, determinada a combater todo movimento que considerassem capaz de por em risco sua hegemonia política.

Como o Global Pode Ser Local?

Muitas vezes as políticas públicas aplicadas em uma localidade não foram formuladas na mesma, provém de Organismos cuja dimensão ultrapassa as fronteiras de um município, de um estado e até mesmo de uma nação. Os Organismos Multilaterais (OM’s), como ONU, OMC, OEA, etc., são grandes formuladores de políticas públicas de ação global, mas de aplicação local. Há diversas formas de funcionamento para essas políticas públicas, mas em geral elas são estabelecidas como uma parceria entre o OM e a instituição local. Organismos ligados à ONU como a Unicef e a Unesco, são responsáveis por formularem políticas que orientam as ações das administrações públicas locais em determinadas áreas, como infância e educação, por exemplo. Os governos locais tendo conhecimento da existência de tais políticas, entram em contato com as OM’s a fim de estabelecer uma parceria. As administrações locais geralmente tem de se ajustar às exigências do organismo, sob pena de não terem sua proposta de parceria aprovada. Isto também ocorre quando um governo local busca financiamento junto a um OM como o BIRD e o BID, para a implementação de uma política ou a construção de alguma estrutura pública. Também nestas situações há a necessidade dos governantes locais atenderem a certos requisitos pré-estabelecidos pelo OM. Existem situações em que estes organismos apenas orientam a formulação e implementação de políticas públicas municipais, estaduais ou federais, quando o OM adota alguma forma de padrão de avaliação para mensurar o avanço de determinada localidade em uma área específica, os governantes locais passam a trabalhar com base nos critérios adotados pela OM em questão, de modo a se enquadrar nos padrões adotados por ela e desta forma serem bem avaliados pela mesma. Essas são algumas formas de como o global pode ser local, mas há também exemplos de como políticas locais podem se tornar globais. Geralmente as administrações públicas não se pautam exclusivamente pela orientação dos OM’s, nem mesmo, apenas reproduzem as medidas implementadas por eles. É normal os governos locais formularem políticas próprias que busquem solucionar uma demanda específica de sua população, o eventual sucesso dessas ações podem despertar o interesse de um OM, que buscará conhecer os procedimentos envolvidos na implementação desta política, adicionando-a à sua lista de propostas, podendo mesmo ser adotada em uma localidade de um outro país, que enfrenta um problema semelhante. A interação entre os OM’s e os governos locais tem se mostrado positiva ao longo dos anos, principalmente no aspecto social, muitos problemas foram solucionados ou tiveram seus efeitos amenizados. O progressivo aumento da relação de troca de experiências entre os atores globais e os locais resulta do amadurecimento nas relações internacionais e da diminuição das barreiras nacionalistas. Neste cenário, um outro personagem tem adquirido cada dia maior relevância, as Organizações Não-Governamentais (ONG’s). Atuando em conjunto com governos locais e Organismos Multilaterais, elas têm contribuído para o aperfeiçoamento das políticas públicas em diversas áreas. Em alguns casos fiscalizando, em outros trabalhando como um complemento à ação do Estado, as ONG’s hoje possuem um papel muito importante na melhoria dos indicadores sociais.

Mídia e Vínculo Eleitoral

A política é um cenário fecundo, onde sempre há espaço para a concepção de novas teorias e também para o debate, a transformação, a melhoria das já existentes. Sobre este campo das ciências humanas, inúmeros indivíduos se debruçam ao redor do globo, procurando não somente analisar o contexto político regional, nacional e internacional, como também apontar seus limites e problemas e ainda formular alternativas a estes. No Brasil a produção teórica sobre a política ainda é pouca em comparação com países como Inglaterra, Alemanha, França e Estados Unidos, todavia temos bons autores e cada vez mais esta área tem recebido contribuições relevantes de brasileiros. Dentre toda a gama de teóricos políticos em nosso país, destacamos o Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas ( UNICAMP – SP ) e docente do Curso de Ciência Política da Universidade de Brasília ( UNB – DF ), Luis Felipe Miguel. Atuando em particular nas áreas de mídia e política, teoria política moderna e contemporânea, o autor possui diversos artigos publicados em periódicos e três livros escritos, dos quais podemos citar “Política e mídia no Brasil: episódios da história recente” como o mais célebre deles. Seu artigo “Mídia e Vínculo Eleitoral: a literatura internacional e o caso brasileiro” é o objeto de estudo desta resenha. Nele Luis Felipe Miguel aborda a Democracia Representativa analisando ‘a capacidade do processo eleitoral de vincular a ação dos representantes à vontade dos representados’, dentro do contexto de uma sociedade de informação de massa, utilizando para isso elementos da literatura internacional e do cenário político nacional. Buscaremos apontar aqui, não apenas os principais tópicos levantados pelo autor, mas também agregar a estes, comentários próprios e se possível relacionar os temas em análise com as reflexões e constatações de outros autores. Procurando desta forma, primeiramente identificar se há um vínculo eleitoral entre eleitores e eleitos, em segundo lugar discorrer sobre a ação da mídia sobre o processo eletivo, com o intuito de permitir ao leitor destas poucas laudas, uma introdução clara e objetiva da relação entre representação política e meios de comunicação.  

Obstáculos à Melhoria do Vínculo entre Eleitores e seus Representantes 
A Democracia é vista historicamente como o “governo do povo e para o povo”, dentro desta concepção subtende-se a participação direta do cidadão no processo de tomada de decisões, esta era a prática na Grécia da Antigüidade, quando os atenienses[1] se reuniam na Ágora, ou seja, em praça pública para deliberar sobre a administração da polis. No entanto, nas democracias modernas isto não ocorre mais, principalmente pela impossibilidade efetiva de todos os indivíduos detentores de direitos políticos participarem diretamente de todas as decisões envolvendo o Estado. Para solucionar este problema, adotou-se um sistema de representação, onde o cidadão votaria em um candidato delegando a ele o poder para legislar, para agir em nome do povo. A Democracia Representativa então, era uma alternativa à impraticabilidade da Democracia Direta em uma sociedade densamente populosa e também dava legitimidade aos governantes, diminuindo os custos da dominação política. Por outro lado, ela acarretaria um fator complicador que colocaria em questão o conceito de democracia como um “governo do povo e para o povo”, a dissonância entre a ação dos representantes e a vontade dos representados[2]. Existe uma relação entre eleitos e seus eleitores, este vínculo criado através do processo eleitoral é bastante frágil nas democracias modernas, pois este enfrenta uma série de obstáculos, que dificultam a fiscalização pelos cidadãos da atuação do mandatário na gestão do patrimônio público. Em primeiro lugar constata-se que há diversos impedimentos formais e estruturais à verificação pela população, do comprometimento dos governantes com as demandas da sociedade, o que acarreta baixos níveis de accountability, isto é, pouca prestação de contas pelos representantes aos seus representados. Nota-se também que os mandatários estão sujeitos a fortes influências, exercidas por grupos de pressão ou lobies organizados dentro da sociedade, que buscam benefícios específicos e na maioria dos casos nada tem a ver com o bem-estar comum da sociedade. Há também a possibilidade de que os governantes defendam, mesmo que veladamente, interesses próprios; utilizando-se das benesses do cargo que ocupam para angariar alguma forma de lucro pessoal. Esses três fatores complicadores geram um outro, o desinteresse do cidadão pelas questões públicas, pois tendo o processo representativo demonstrado falhas, ele cai em descrédito em relação ao eleitor, que tende a se afastar do debate público e se ater a assuntos de caráter privado. Este último problema é agravado inda por um outro, a adoção de um sistema de governo representativo implica em uma restrição do fluxo de informações; o conhecimento do conteúdo e das implicações dos assuntos tratados na arena política se torna uma quase exclusividade dos detentores de cargos públicos e da parcela mais politicamente ativa da sociedade, que através de partidos, associações de classe e outras organizações, buscam participarem do debate público. Luis Felipe Miguel, dá especial importância a este último obstáculo ao aprimoramento do vínculo eleitoral, considerando que sem as informações necessárias o cidadão não pode ter uma percepção real do mundo político e social em que está inserido e desta forma sua capacidade de julgamento fica comprometida. Ele observa que, se a população tem seu acesso às informações restringida, pelos fatores já elencados, à mídia[3] caberia prover ao cidadão o conteúdo informacional necessário para que ele possa se situar e atuar conscientemente dentro do sistema representativo, aprimorando o vínculo eleitoral entre representantes e representados, aproximando estes dos primeiros e assim exercendo uma maior fiscalização de seus atos. Dentro desta perspectiva, a confiança da população na imparcialidade dos meios de comunicação e da veracidade das informações por eles veiculadas adquire grande importância. Em uma sociedade cada vez mais complexa aumenta a necessidade das pessoas obterem um volume maior e melhor de informações que as auxiliem a compreender o mundo em que vivem, a mídia surge então como a principal provedora desta necessidade. Apesar do jornalismo contemporâneo ter a capacidade de condensar o vasto conteúdo informacional disponível e a agilidade em veiculá-lo, vem sendo crescentemente questionada a credibilidade e o potencial de melhoria do vínculo eleitoral dos meios de comunicação. Estaria a mídia isenta de interesse nas informações que disponibiliza para a sociedade? Quais os critérios para definir a pauta do que é e do que não é relevante para a população? Tendo em vista que, oferecem um “recorte da realidade, resultante das decisões de um grupo restrito de profissionais e submetidos aos constrangimentos próprios do campo jornalístico[4]”. Estes e outros aspectos referentes à influência exercida pela mídia sobre o vínculo eleitoral, trataremos a seguir. 

A Relação entre Mídia e Processo Eleitoral: aporte teórico 
A discussão sobre a ação da mídia sobre o processo eleitoral em democracias representativas é relativamente recente, pois se inicia com a difusão dos meios de comunicação de massa, particularmente o rádio, no limiar do século XX. Data desta época a teoria proposta por Harold Lasswell, que considera a mídia como onipotente e o indivíduo um consumidor passivo do conteúdo veiculado por ela; o cidadão neste caso perderia sua iniciativa própria, reproduzindo automaticamente o que por ela é transmitido. Por ser considerada simplista e não considerar outros fatores que comprovadamente influenciavam na visão de mundo das pessoas, como a tradição por exemplo, esta tese perdeu espaço para a corrente dos “efeitos limitados”. Esta, por sua vez, credita grande importância ao meio social, que seria o principal motivador da decisão de voto e de adesão política. As pessoas estariam propensas a reproduzir não mais o que é ditado pela mídia, mas as opiniões de seus familiares, amigos, colegas de trabalho. Esta teoria, que tem como uns de seus principais expoentes os americanos P. F. Lazarsfeld e B. R. Berelson, contribuiu ainda para o estudo da relação entre a mídia e o processo eleitoral com a formulação do conceito de “formadores de opinião”, através da tese do fluxo comunicacional em duas etapas ( two-step flow of comunication ), identificando a existência de um grupo de intermediários responsável por uma espécie de filtragem das informações disponibilizadas através da mídia e o emprego de técnicas de sondagem de opinião e de tratamento estatístico dos dados. Estas contribuições reduziram a importância atribuída aos meios de comunicação como determinantes da opinião da sociedade. Tais constatações estimularam pesquisas e teses posteriores, como a hipótese da “agenda-setting” elaborada por M. McCombs e D. Shaw. Esta teoria desenvolve a idéia de que os meios de comunicação de massa são decisivos na indicação dos temas mais importantes do momento, gerando reflexos nas opiniões e decisões dos cidadãos comuns, do governo e da elite política. Esta influência exercida pela mídia sobre os entes políticos seria controlada, segundo autores liberais, pelo próprio mercado dos meios de comunicação. Que através da competição e da fiscalização mútua proporcionaria à sociedade o acesso a “informações verdadeiras”. Esta concepção colabora para a teoria de Bernard Manin, que vê a mídia como uma substituta dos partidos como veículo do contato entre representantes e representados. Nesta chamada “democracia de audiência”, a confiança pessoal do eleitor depositada em um candidato, se deve à imagem construída por este último através da mídia e não mais aos vínculos locais, fator de adesão no período “parlamentarista” das democracias representativas, ou ainda, por um sentimento de identificação de classe, próprio de uma “democracia de partidos”. Mesmo sendo a teoria mais em voga contemporaneamente, ela também enfrenta críticas. Uma delas é a que compara a cobertura realizada pelos meios de comunicação a uma corrida de cavalos ( horse-race ), que dá importância apenas à colocação dos candidatos na disputa eleitoral. Sobre este prisma, as sondagens de opinião pública se tornam o interesse principal da cobertura de campanha, em detrimento das propostas e programas de governo daqueles que disputam a eleição. Segundo pensadores como Joseph Capella e Kathleen Hall Jamieson, isto é fruto de uma visão cínica que os jornalistas fazem do mundo político, considerando que os políticos estariam preocupados somente com a conquista e a manutenção do poder, e suas propostas e compromissos não teriam outra finalidade senão a manipulação do eleitorado. Esta perspectiva o jornalismo como um todo, não apenas o televisivo ou o impresso.  

Mídia e Vínculo Eleitoral: o contexto brasileiro
O Brasil não se enquadra na norma que atribui aos partidos políticos o papel central na canalização de interesses e demandas e no processo de adesão eleitoral, e que considera ainda, os meios de comunicação como “intrusos” no funcionamento da democracia. Isto porque, nosso país nunca possuiu um sistema representativo-partidário ideal, onde a mídia apareceria como um fator desorganizante daquilo que se encontrava perto da perfeição. O autor aponta quatro elementos que contribuem para esta afirmação, primeiramente ele aponta que a personalização da política no Brasil não é decorrência da chamada “democracia de audiência”, mas sim do sistema eleitoral aqui adotado, um sistema de representação proporcional com listas abertas, serviria como um estímulo à competição intrapartidária, com cada candidato montando um aparato de campanha próprio, para concorrer com seus adversários, incluindo seus companheiros de partido. O segundo fator apontado por ele, diz respeito à volatilidade do regime de partidos. As listas abertas, além de fazer com que as votações sejam patrimônio dos candidatos e não dos partidos, tiram poder das direções partidárias, tornando-as incapazes de determinar as ações de seus membros que possuem cargo eletivo. Isto, aliado a regras que possibilitam coligações eleitorais heterodoxas e a inexistência de instrumentos legais que exijam fidelidade partidária, enfraquecem os partidos, porque tem repercussão negativa entre o eleitorado. Isto faz com que Luis Felipe Miguel escreva: “Fica claro que o enfraquecimento dos partidos não é efeito da mídia e sim de variáveis institucionais de longo curso no país[5]”. O terceiro item levantado pelo autor que contribui para o não enquadramento do Brasil na norma extensamente aplicada nas democracias representativas mais avançadas, que dá aos partidos políticos um papel de centralidade e considera a mídia como uma intrusa que desorganiza o processo democrático, é a concentração da mídia. A mídia em nosso país é semi-monopolística, está centralizada no Grupo Globo de Comunicação, que além de atuar fortemente na mídia impressa e radiofônica, detém mais da metade da audiência televisiva e grande parte da verba publicitária, o que não ocorre em outros países, como a Alemanha, onde a emissora líder possui em média, 16% da audiência. Portanto, os relativos benefícios, decorrentes da competição e da fiscalização mútua não se realizam no contexto nacional. Por fim, vemos que a televisão tem um peso diferenciado na sociedade brasileira, pois se os índices de acesso à mídia televisiva no Brasil se comparam à dos países de democracia mais avançada, com 100% do território nacional coberto pelas redes de televisão[6], os índices de escolaridade são díspares, com uma alta taxa de analfabetismo em determinadas localidades. O que dificulta a existência, nas palavras do autor, “de um diálogo minimamente equilibrado entre conhecimentos e valores socializados pela instituição escolar e aqueles que os meios de comunicação de massa transmitem”. O que colabora para que no Brasil, o aparelho ideológico dominante não sejam os partidos ou o Estado, mas sim os meios eletrônicos de comunicação, em especial a televisão. Através desta breve resenha pudemos identificar que existe entre representados e seus representantes um vínculo eleitoral, todavia como também verificamos, este vínculo é tênue, devido aos vários obstáculos, muitos dos quais são decorrentes do próprio sistema representativo. Este também pode servir como um elemento de melhoria, de qualidade do vínculo eleitoral, na medida que se realizam eleições periódicas. A eleição, portanto, é o principal mecanismo para garantir ao eleitor que os governantes quando eleitos levarão em conta suas demandas, preocupados com o sucesso em pleitos futuros. Transpassando toda esta discussão, analisamos a ação da mídia sobre o campo político e constatamos que as teorias são diversas e conflitantes, vão desde a visão que considera os meios de comunicação como um não-problema até a que os que vêem a mídia como a grande vilã da democracia, interferindo e desorganizando o processo democrático. É certo afirmar, que não há uma regra universal sobre a relação entre mídia e processo eleitoral, sua composição, propósito, funcionamento, tende a variar dependendo do contexto analisado. Estas questões adquirem maior relevância no cenário brasileiro de consolidação democrática, seu estudo e problematização, servem como potenciais fontes de melhoria dos processos eleitorais e do papel social desempenhado pelos meios de comunicação de massa no país. 
 
 Notas
[1] Menos as mulheres, jovens, estrangeiros, servos e escravos, isto é, a maior parte da população da cidade. [2] Ver, Hirst, Paul; “A Democracia Representativa e seus Limites”, Jorge Zahar Editor; para uma visão mais detalhada da questão. [3] O jornalismo entendido no sentido amplo, a divulgação de notícias através da imprensa escrita, do rádio, da televisão e da Internet. [4] MIGUEL, Luis Felipe; Mídia e Vínculo Eleitoral: a literatura internacional e o caso brasileiro, Opinião Pública, Volume 10, nº 1, p. 03, Campinas, 2004. [5] Op.cit., p. 10. [6] Revista Mídia e Dados, Grupo de Mídia de São Paulo, in, NOVAES, Adauto (org. ), Rede Imaginária – Televisão e Democracia, 2º Ed., p. 311, Companhia das Letras.