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Conselhos Gestores de Políticas Públicas

Diante das demandas econômicas, políticas e sociais que surgem no meio da sociedade, há a necessidade de buscar alternativas que satisfaçam estas necessidades. Na busca deste objetivo ocorre um processo de formulação de regras e construção de mecanismos organizacionais que possam efetivar os desejos dos cidadãos. Esta dinâmica é comum à maioria das sociedades contemporâneas. No entanto, em cada localidade, região ou nação, existem variáveis próprias que acabam sendo determinantes para a configuração das formas institucionais a serem estabelecidas. As instituições resultantes da negociação entre os diferentes atores de uma determinada realidade podem ser também interpretadas como arranjos institucionais (FREY, 2000, p. 240). A promulgação da Constituição Federal de 1988 representou uma ampliação dos direitos dos cidadãos, visando uma sociedade mais democrática e menos desigual. A partir de então, diferentes forças políticas e sociais se mobilizaram para que os ditames estabelecidos na carta constitucional fossem verdadeiramente efetivados.
As reivindicações da população cresceram e foram encabeçadas pelos movimentos sociais, que pleiteavam um maior acesso ao processo decisório estatal. Em resposta às ações dos atores da sociedade, o Estado brasileiro se modificou e se tornou mais acessível (DIAS, 2004, p. 206), seja com o surgimento de novos arranjos institucionais que possibilitaram a interação entre a sociedade civil e a administração pública, seja também, em virtude da incorporação de temáticas que não compunham a agenda pública até então (DAGNINO, 2002, p. 10). Esta integração entre sociedade e administração estatal é importante para a sustentabilidade e o desenvolvimento das políticas públicas, em particular na área social (NOGUEIRA, 2004, p. 118). A participação também é um dos elementos fundamentais de uma democracia contemporânea. O interesse que as pessoas possuem em fazer parte dos processos decisórios, e a delegação de poderes por parte da população e dos entes da sociedade civil organizada, para que representantes possam apresentar suas demandas na arena política, possibilitam o aprimoramento dos mecanismos democráticos.
As demandas sociais brasileiras, embora há muito conhecidas, historicamente sempre estiveram latentes do ponto de vista institucional, condicionadas a um modelo contratual contributivo no qual segmentos expressivos da sociedade não contavam com assistência previdenciária e social. Com a Constituinte de 88 este modelo foi abandonado e adotou-se outro baseado na universalização da seguridade social (CUNHA; CUNHA, 2002, p. 14), que durante a década de 1990 seria mais bem debatido e regulamentado. Neste período muitos serviços que outrora estavam sob a responsabilidade exclusiva da esfera federal, se tornaram atribuições de Estados e municípios. Esta redefinição das funções entre os três níveis de governo ocorria dentro de um processo de reforma administrativa, que tinha como pano de fundo as concepções de descentralização e democratização dos serviços sociais do Estado.
Nas duas últimas décadas a participação social no Brasil, tem se manifestado por meio de diferentes arranjos institucionais, como organizações sociais (ONGs, Fóruns, Movimentos); como instrumentos decisórios ou de proposição de leis (Plebiscito, Referendo, Iniciativa Popular) e ainda como espaços de deliberação ou gestão de políticas públicas (Audiência Pública, Conferência de Políticas, Conselhos) (KAUCHAKJE, 2007, p. 76-83). Os arranjos institucionais que emergiram a partir do cenário nacional contemporâneo são diversos em sua forma, abrangência e orientação temática. Na perspectiva de abrir o processo decisório envolvido na formulação de políticas públicas para a participação da sociedade, foram criadas inúmeras formas de arranjos institucionais, uma das mais comuns é a dos conselhos gestores. Eles se caracterizam como “espaços públicos de composição plural e paritária entre Estado e sociedade civil, de natureza deliberativa, cuja função é formular e controlar a execução de políticas públicas setoriais” (TATAGIBA, 2002, p. 54). Estas novas instâncias deliberativas exercem também uma forma de controle social da atividade estatal, não apenas isto, elas também possibilitam “uma elevação do grau de participação popular a diferentes níveis do processo de decisão, elaboração e implementação das políticas” (DRAIBE, 1989, 35s).
O trabalho desenvolvido nos conselhos gestores muitas vezes é prejudicado por fatores que podem alterar o equilíbrio necessário ao processo decisório entre sociedade e governo; os principais são: dificuldade dos atores, tanto governamentais quanto não-governamentais, em lidar com a pluralidade; a relação conselheiro-entidade; a qualificação dos conselheiros para o exercício de suas funções, entre outros (TATAGIBA, 2002, p. 57). O principal complicador está na relação entre os representantes do governo e os da sociedade; por possuírem meios materiais e humanos em maior proporção e por muitas vezes terem uma agenda pré-definida, os conselheiros ligados ao Estado podem tentar exercer um controle das temáticas debatidas, se recusando em compartilhar o poder decisório.
Outros limites são impostos à prática deliberativa nos Conselhos pela competição entre os membros pela alocação de recursos, por propostas de políticas públicas concorrentes, pela defesa de interesses particulares em detrimento dos posicionamentos resultantes do debate e pela falta de capacitação dos representantes. Estas dificuldades podem ser superadas e não diminuem a importância dos Conselhos, dada a função que hoje cumprem junto à administração pública, no controle sobre as ações e decisões governamentais, na discussão publicização dos projetos públicos, e na construção de consensos entre Estado e sociedade (CUNHA; CUNHA, 2002, p.19).


Referências

CUNHA, Edite da Penha; CUNHA, Eleonora Schettini. Políticas Públicas Sociais. In: CARVALHO, Alysson; SALLES, Fátima; GUIMARÃES, Marilia & UDE, Walter (Orgs.). Políticas Públicas. Belo Horizonte: Editora UFMG, p. 11-25, 2002.

DAGNINO, Evelina. Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. In DAGNINO, Evelina (Org.). Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, p. 9-16, 2002.

DIAS, Marcia Ribeiro. Desejo de Mudança: das motivações e razões que levaram à derrota do PT em Porto Alegre nas eleições de 2004. Civitas (online). Porto Alegre, v. 08, n. 2, p. 237-257, 2008. Disponível em: http://revistaseletronicas .pucrs.br/ojs/index.php/civitas/issue/view/335.

DRAIBE, Sônia Miriam. As Políticas Sociais Brasileiras: diagnósticos e perspectivas. In: IPEA – Para a Década de 90: prioridades e perspectivas de políticas públicas. Brasília, v. 4, p. 1-66, 1989.

FREY, Klaus. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Publicas, Brasília: IPEA, v. 21, p. 211-259, 2000.

KAUCHAKJE, Samira. Gestão Pública de Serviços Sociais. Curitiba: Ibpex, 2007.

NOGUEIRA, Marco Aurélio. Um Estado para a Sociedade Civil: temas éticos e políticos da gestão democrática. São Paulo: Cortez, 2004.

TATAGIBA, Luciana. Os Conselhos Gestores e a Democratização das Políticas Públicas no Brasil. In: DAGNINO, Evelina (Org.). Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, p.47-103, 2002.

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