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Análise de Políticas Públicas por meio da Perspectiva Institucional

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 As ações implementadas pelo Poder Público sempre foram objeto de debate por parte da sociedade, basta que uma iniciativa governamental esteja em curso para que as pessoas em geral teçam comentários e perspectivas sobre ela. O colóquio cotidiano realizado em família ou na vizinhança sobre as atividades do Poder estatal pode satisfazer os anseios de uma ampla maioria da população, mas não pode contemplar as necessidades do estudioso dos assuntos da administração pública, que procura analisar os fatos a partir de uma matriz teórica e empírica. Neste sentido, as instituições são um fator central para o entendimento da relação do indivíduo e sua coletividade com o Estado, no processo de formulação de políticas públicas.
Inicialmente o enfoque institucional era centrado no estudo das organizações nas áreas da Economia e da Administração e possuía um caráter prescritivo voltado para o desenvolvimento das organizações (aspecto estrutural) e seu processo de aceitação perante a sociedade (aspecto comportamental), o que contribuiria para sua sobrevivência no mundo dos negócios (PECI, 2006, p. 2). O processo de desenvolvimento do enfoque institucional como uma possibilidade analítica e explicativa tem origem no final do século XIX, no entanto, foi a partir dos estudos desenvolvidos por Philip Selznick na década de 1950 que o viés organizacional pôde contar com uma maior sistematização.
Além de lançar as bases da perspectiva institucional contemporânea, ele também foi responsável pela caracterização do “processo de institucionalização”, que consiste na substituição dos valores técnicos na determinação de tarefas organizativas, por valores do ambiente social que ao longo do tempo modificam as organizações, transformando-as em sistemas orgânicos (CARVALHO; VIEIRA; LOPES, 1999, p. 1). Na abordagem institucional o papel que a ação racional individual e suas formas de organização possuem é secundário, em face da importância dada à relação das instituições com o seu ambiente. Neste sentido, elas passam a incorporar elementos do contexto social em que estão inseridas, buscando a adequação de suas ações e sua legitimização perante este mesmo ambiente (idem, p. 7).
Esta perspectiva para o estudo das instituições não constitui uma única corrente de pensamento, segundo o trabalho de Peter Hall e Rosemary Taylor (2003), na Ciência Política há pelo menos três formas de análise distintas do que se convencionou denominar “neoinstitucionalismo”[1], o institucionalismo histórico, o da escolha racional e o sociológico. Tais correntes de pensamento, apesar de se desenvolverem de forma independente uma da outra, possuem em comum a reação às abordagens behavioristas[2] e a preocupação em conhecer a influência das instituições “na determinação de resultados sociais e políticos”. São, portanto, uma possibilidade para que se possa compreender as ações do Estado, e também, o comportamento dos atores políticos da sociedade em relação a elas, aspectos que adquirem ordem e previsibilidade ao serem analisados por meio da perspectiva institucional (MARCH; OLSEN, 2008a, p. 4).
O potencial das teorias neoinstitucionais para a análise das pesquisas sobre políticas públicas, principalmente no que tange à influência das ideias na sua formulação e para o entendimento da mudança institucional, fez com que a partir da década de 1980, muitos estudiosos do campo das políticas públicas adotassem este viés conceitual em suas análises e assim expandissem seus horizontes de estudo (ROCHA, 2005, p. 12). Considerando que uma política pública é caracterizada por elementos institucionais, ligados à autoridade formalmente instituída; decisórios, correspondentes ao conjunto de escolhas; comportamentais, relacionados às ações vinculadas às decisões tomadas; e causais, como produto das ações adotadas (SARAIVA, 2006, p. 31). A aplicação da abordagem neoinstituciuonal para a análise das políticas públicas parece apropriada, pois suas características são objeto de apreciação pelas principais correntes teóricas do novo institucionalismo. March e Olsen defendem que o conjunto de ideias neoinstitucionais é valoroso para os pesquisadores do cenário político, pois de acordo com estes autores, estas teorias:

“Minimizam a dependência do Estado politicamente organizado com relação à sociedade em favor de uma interdependência entre instituições sociais e políticas relativamente autônomas; elas minimizam a simples primazia de microprocessos e histórias eficientes em favor de processos relativamente complexos e da ineficiência histórica; elas minimizam as metáforas da escolha e os resultados alocativos em favor de outras lógicas de ação e da centralidade do significado e da ação simbólica” (MARCH; OLSEN, 2008, p. 4).

Devido ao seu potencial explicativo, particularmente em relação à compreensão da função desempenhada pelas ideias na formulação de ações pela administração pública e as motivações necessárias para a mudança no ambiente institucional, o enfoque neoinstitucional contribui positivamente para pesquisas realizadas sobre os processos de decisão e o estabelecimento de modelos de gestão pública. No entanto, dada a sua aplicabilidade à pesquisa empírica, a abordagem dos novos institucionalismos tende a apresentar uma visão segmentada dos cenários socioeconômicos e políticos, não tendo o alcance teórico de macro-teorias como o marxismo e o pluralismo para a explicação da realidade (ROCHA, 2005, p. 27). A utilização dos conceitos neoinstitucionais na análise das políticas públicas também precisa ser realizada com cautela, principalmente em “sistemas políticos em transformação onde as instituições não estão consolidadas”, sendo que nestes cenários a capacidade das instituições os estabilizarem, tende a ser supervalorizada, em detrimento do ônus inerente a todo processo de institucionalização, como por exemplo, a excessiva burocratização e os problemas que ela gera (FREY, 2000, 230s).

REFERÊNCIAS
CARVALHO, Cristina Amélia; VIEIRA, Marcelo Milano Falcão; LOPES, Fernando Dias. Contribuições da perspectiva institucional para análise das organizações. In: XXIII Encontro Nacional de Programas de Pós-Graduação em Administração, 1999, Foz do Iguaçu. Anais do XXIII EnANPAD. Porto Alegre : ANPAD, v. 1. p. 1-15, 1999.

DIMAGGIO, P. e POWELL, W. (1997). Le néo-institutionnalisme dans lanalyse des organisations, Politix, n. 40. p. 113-154. 1997. Disponível em: http://www.persee.fr/web/revues/home/prescript/revue/polix.

FREY, Klaus. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Publicas, Brasília: IPEA, v. 21, p. 211-259, 2000.

HALL, Peter; TAYLOR, Rosemary C. R. As três versões do neoinstitucionalismo. Lua Nova. N. 58, p. 193-224, 2003.

MARCH, James Gardner; OLSEN, Johan Peder. Neo-institucionalismo: fatores organizacionais da vida política. Revista de Sociologia e Política. Curitiba, v. 16, n. 31, p. 121-142, 2008.

PECI, Alketa. A Nova Teoria Institucional em Estudos Organizacionais: uma abordagem crítica. Cadernos EBAPE.BR. FGV, Volume IV, Nº I, Março de 2006.

ROCHA, Francisco Vasconcelos. Neoinstitucionalismo como Modelo de Análise para as Políticas Públicas. Civitas, Porto Alegre, v. 5, n. 1, p. 11-28. 2005.

SARAIVA, Enrique. Introdução à Teoria da Política Pública. In: SARAIVA, Enrique; FERRAREZI, Elizabete (Orgs.). Coletânea Políticas Públicas. Brasília, ENAP, v. 1, p. 21-42, 2006.


[1] O termo neoinstitucionalismo se deve mais em função do resgate do interesse sobre as instituições a partir da década de 1970, do que uma contraposição com um “velho” institucionalismo praticado até a década de 1950. No entanto, isto não implica que não haja uma comparação entre novas e antigas correntes institucionais, o que de fato ocorre, como por exemplo em Dimaggio e Powell (1997), principalmente ao abordarem o institucionalismo na sociologia.
[2] Behaviorismo deriva da palavra de origem inglesa behavior, que significa comportamento, conduta, atitude, compreende um campo de estudo da Psicologia (escola de análise do comportamento), a teoria behaviorista não é apenas utilizada por este campo da ciência, mas também em outros, para explicar as iniciativas do indivíduo e sua coletividade em diferentes contextos.